No Século 17, não existiam retratos falados. O primeiro só seria publicado cerca de 200 anos depois, em 1881. Por isso, as imagens atribuídas ao pernambucano Zumbi (1655-1695), líder negro da resistência do Quilombo dos Palmares, quase sempre destoam de uma representação mais fidedigna.
“A sua figura física não era de um homem forte, mas franzino. De determinação forte, sim, e sagacidade”, revela a socióloga Delma Josefa da Silva, pesquisadora em questões raciais e quilombos, convidada da sétima e última edição da série Grandes Personalidades da História do Nordeste.
A iniciativa da Fundação Joaquim Nabuco será transmitida nesta quinta-feira (30), às 17h, no canal oficial da Instituição, no YouTube. Mediação da jornalista Lady Lima.
Com o tema Zumbi dos Palmares: de insurgente à personalidade nacional, a socióloga comentará aspectos históricos sobre e em torno da figura do personagem, mas, também, reflete sobre a influência do líder de um dos mais importantes quilombos das Américas na atualidade.
“Ele extrapola a História, pois se converteu desde o tempo em que vivia e até nos dias de hoje em um símbolo. Passados já 325 anos da morte de Zumbi e da destruição dos Palmares, muitas das questões daquela resistência e daquela violência continuam como pendências do Brasil”, diz Mario Helio, diretor de Memória, Educação, Cultura e Arte, da Fundaj. “Concluímos o ciclo de palestras em alto estilo com o herói e mártir”, celebra.
No evento online, o público poderá entender o contexto de Palmares, nos séculos 16 e 17, na perspectiva de um projeto societário. “Eles fogem da região canavieira e vão constituir o quilombo subindo a Serra [da Barriga, em União dos Palmares], procuram se situar mata adentro, o mais distante possível das possibilidades de captura.
Os quilombos, originalmente na África, têm estruturas militares para a conquista de territórios. No Brasil, para se defender, eles vão dominar muito dessas táticas e estratégias. Não foi à toa que resistiu tanto tempo — por mais de 100 anos. Eles tinham armadilhas, mirantes e Zumbi o preparo. Por isso, seu tio Ganga Zumba o escolhe para ser o chefe militar, por ter muita liderança”, aponta.
Outro aspecto a ser abordado é a biografia de Zumbi, batizado Francisco quando adotado pelo Pe. Antônio Melo, com quem aprendeu português e latim — falava, ainda, kimbundo e iorubá.
Embora ainda existam poucos registros sobre a história do personagem, sabe-se que ele nasceu livre, na própria Palmares. Mas foi capturado e entregue ao padre missionário, com quem convive até os 15 anos, quando consegue fugir e voltar ao quilombo.
“Zumbi emerge como líder aos 23 anos. Ele foi preparado sim, tanto na arte estratégica da guerra [com Ganga Zumba], como para a habilidade política. Por ter vivido tanto tempo com o padre, transitava pela cidade e sabia das negociações. Teve essas duas experiências na vida.”
Pesquisadora das questões raciais desde o fim da década de 1990, Delma se tornou especialista em quilombos e publicou doutorado sobre o tema em 2017. Nesse processo, comenta as narrativas lançadas contra o alagoano, como a de que Zumbi teria escravizado outros negros.
“São especulações levantadas no início dos anos 2000 e não têm fundamento. Ancoram esta alegação no fato de que, na África, isso seria comum. Mas não tem uma pesquisa que sustente”, ao destacar os poucos nomes que investigaram os raros registros disponíveis sobre o Período da Escravidão no Brasil: o jornalista e historiador brasileiro Décio Freitas, o escritor Joel Rufino dos Santos e a jornalista e escritora Marilene Felinto.
“Zumbi é um personagem que incomoda até hoje. Essa perseguição tem início com o Estatuto da Igualdade Racial [Lei Federal 12.288/2010], que mexe com as estruturas de Estado a fim de promover correções das desigualdades”, aponta a especialista, ao mencionar dois fatos históricos: na década de 1837, por meio da Lei nº 1, os negros são proibidos de frequentar escolas, ainda que livres. Só na Constituição de 1988 é que os quilombos serão reconhecidos territórios estabelecidos no Brasil.
Serviço Grandes Personalidades da História do Nordeste VII Zumbi dos Palmares: de insurgente à personalidade nacional Palestrante: Delma Josefa da Silva, socióloga Data: quinta-feira, 30 de julho Horário: 17h Transmissão no canal da Fundaj no YouTube